segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

No Capítulo Analogias, do livro "A Vida Misteriosa de René Descartes, faz-se a analogia entre o pensamento de Descartes, de Paracelso, Comenius, Newton e... a trilogia Matrix.

V.6.3 Analogias III- Descartes, Rosacruz e MATRIX

Chegamos a um tema verdadeiramente controverso no contexto deste livro. Que semelhança pode haver entre Descartes, a filosofia Rosacruz e os filmes da série Matrix, realizada pelos irmãos Wachowski? Elas são tão numerosas que seria necessário outro volume somente para as enumerar e desenvolver. Por isso, o nosso objectivo continua a não ser tarefa fácil, tanto mais que estamos conscientes do risco que corremos, de que este capítulo possa desvirtuar esta obra, por não ter “dignidade” para servir de termo de comparação com a filosofia cartesiana e com a espiritualidade rosacruciana.

Como puderam eles realizar uma película tão representativa de toda a simbologia gnóstica? São inúmeros os autores, principalmente professores de Filosofia em conceituadas universidades, que se dedicaram a analisar esses símbolos com base em elementos filosóficos que vão da Metafísica à Ética, passando pela Filosofia das Religiões e Epistemologia. Em particular, muitas destas considerações estão consignadas no livro ”Matrix - bem-vindos ao deserto do real”, uma colectânea de William Irwin, professor no King’s College, na Pensilvânia, que convidou vasto grupo de Professores de Filosofia nas mais qualificadas universidades dos Estados Unidos e Europa, todos eles com relevantes Curricula,[1] para refletirem sobre o significado simbólico do primeiro filme da trilogia.
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Certamente nunca saberemos se os autores tiveram a intenção que lhes atribuímos, por isso, limitamo-nos a apresentar os elementos e as perplexidades, deixando ao leitor a oportunidade de colocar questões e reflectir nas respostas. Uma coisa é constatável: ao longo da história da literatura, nomeadamente, no século XX, inúmeras obras relatam histórias eivadas de simbolismo que não podem descrever melhor, a via rosacruciana. (ver Referências Bibliográficas).

Para começar, Matrix representa uma metafísica dualista, uma visão sobre a natureza final do mundo segundo a qual este é composto exactamente de dois tipos incompatíveis de fenómenos: o mundo das aparências (o irreal da Matriz e que podemos comparar à nossa natureza dialéctica, ilusória e corrompida) e o mundo real (dos humanos em guerra com as máquinas, correspondente ao mundo da Vida Original), dois mundos aparentemente irredutíveis e inconciliáveis, cada um com as suas próprias leis e que não possuem qualquer possibilidade de comunicação. Esta visão opõe-se ao monismo, segundo o qual, existe um único tipo de vivência, ou seja, aquilo que os nossos sentidos nos mostram é a única realidade: nada é ilusão, tudo é palpável.
Ao falarmos destes dois mundos é absolutamente imediata a associação com a “alegoria da caverna”, de Platão: um mundo em que os habitantes nem se colocam a questão de poderem não estar a viver a realidade, de não se aperceberem de que habitam na escuridão, de que eles próprios e tudo à sua volta não passam de sombras projectadas pela escassa iluminação de uma fogueira que arde por detrás deles (a Matrix), e de que do outro lado do muro está um mundo pleno de luz onde, aí, sim, tudo é real...






 

 




[1] Como se pode constatar na página 285 da edição da Madras de 2003.
 

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016


PREFÁCIO

 

É preciso ler entre as linhas da história e repensar e contextualizar os acontecimentos para vislumbrar algo do essencial. Por detrás do óbvio esconde-se o subtil e o inesperado e a verdade está oculta atrás dos véus do saber aparente. Esta capacidade de duvidar foi sem dúvida a chave daquilo que René Descartes manifestou através da sua vida e através da sua obra e que marcou profundamente a história do ocidente. Enquanto uns o culpam de suposto racionalismo frio e o responsabilizem, em certa medida, pelo rumo que as sociedades modernas tomaram, outros há que tentam perceber se este estigma é realmente merecido ou se nos escapa algo de importante.

Com a mesma persistência e capacidade de duvidar e de pôr em causa a verdade aparente e superficial, a autora evidência de maneira apaixonante, os fios escondidos que conectam os episódios, personagens e acontecimentos do mundo contemporâneo de René Descartes e lança uma nova luz sobre a Renascença, debruçando-se sobre os diversos impulsos que nasceram naquela época. Através duma pesquisa notável e profunda, a autora encontra indícios importantes que demostram aspectos menos conhecidos da vida de Descartes, penetrando profundamente no espirito daquela época e abordando, além de aspectos biográficos, temas como Paracelso, o Hermetismo e os Manifestos Rosacruzes, do século XVII. Sintetizando um vasto leque de obras, a autora desenvolve um esforço para integrar a obra de Descartes num contexto muito mais vasto, chegando à conclusão de que existe no seu conjunto um aspecto espiritual evidente e que, na realidade, o conhecimento e a espiritualidade não são incompatíveis mas, pelo contrário, não podem viver um sem a outra.

O conjunto destes acontecimentos e impulsos que se manifestaram através da Renascença e também através da obra de René Descartes, permitiram que o homem, em geral, obtivesse a possibilidade de se libertar do domínio das superstições, da ignorância e do obscurantismo, assim como das imposições da igreja que em tempos velava, inclusivamente, sobre a ortodoxia científica.

Pensamos neste contexto também em figuras como Paracelso, Pico della Mirandola, Mestre Eckhart, Erasmus, Comenius, Giordano Bruno e muitos outros que tiveram a coragem de romper com as limitadas perspectivas filosóficas, científicas e espirituais do seu tempo e de apresentar paradigmas completamente novos. Estes impulsos viriam restabelecer o equilíbrio no sentido de retirar o destino humano das mãos de um Deus mesquinho, incompreensível, incognoscível e déspota para, em troca, recolocar a tónica na responsabilidade própria do ser humano e no elemento de escolha e de abertura interior a uma verdadeira realização humana.

Todo o processo de materialização que conhecemos no mundo moderno e que culminou num ser humano inteiramente individualizado e auto-consciente foi, em grande medida, uma consequência dos diversos aspectos de conhecimento que foram revolucionando o mundo a partir da Renascença e que levaram a tantas aventuras como o Iluminismo, a revolução industrial, os descobrimentos, o progresso tecnológico, o desenvolvimento das artes e da música, a instrução escolar generalizada, as descobertas das leis da física e da natureza, a revolução francesa e os primeiros passos para uma democratização da sociedade, etc.

Ainda que muitas vezes soframos as amargas consequências de todos esses desenvolvimentos, também parece ter sido uma necessidade urgente que tudo isto acontecesse, pois através destes acontecimentos foi oferecida à humanidade a ferramenta que lhe possibilitou dar um passo no processo de auto-realização. Para fazer uma escolha consciente é preciso ter conhecimento e para ter conhecimento é preciso ter consciência. Sem estes ingredientes não pode haver liberdade e sem liberdade o ser humano não passa dum robot biológico

É legítimo suspeitar que o génio da matemática, quando formulou e eternizou o seu famoso “cogito ergo sum” ou “eu penso logo existo” fazia referência a algo bastante mais relevante relativo ao “pensar”, do que a mera ruminação cerebral ou episódios de flatulência intelectual. Este tipo de actividade natural de digestão das nossas impressões confunde-se facilmente com “pensar” mas deixa-nos suspirar, com frequência desesperadamente, perante a aparente sem saída da torrente dos pensamentos e acabamos por concluir: “eu penso, mas logo desisto”, considerando o conjunto dos nossos problemas que ultrapassa, largamente, as nossas capacidades de compreensão.

Será muito mais provável que Descartes se referisse através do “cogito”, a algo do género do Manas superior dos Rosacruzes ou do Poimandres da filosofia hermética, que designa, além do elemento racional, um aspecto intuitivo de consciência e do conhecimento, ao reconhecer-se a si próprio como criatura mergulhada na criação e o reconhecimento de ser uma imagem em miniatura da mesma, em que o aspecto mental se torna no elemento criador e unificador por excelência. Através do “cogito”, o ser humano atravessa a fronteira do ser natural ruminante em direcção ao homem universal e livre, que faz Hermes exclamar com espanto: ”É verdade, é seguro, assim como em cima também é em baixo”….

Deixo ao leitor, ao descobrir este livro, a tarefa de formar uma opinião sobre as perspectivas apresentadas, não querendo, no entanto, deixar de sublinhar que, independentemente de tudo, esta obra é uma muito bem documentada e valiosíssima fonte de informação e um relato apaixonado dos acontecimentos que estão na origem da modernidade.

 

Felicito a autora, Maria Teresa Mira de Azevêdo, por este corajoso e importante trabalho, em nome de todos aqueles que acompanharam com interesse e curiosidade a concepção, gestação e nascimento deste fantástico livro e convido os leitores a nele mergulharem e deixarem-se fascinar pelo muito misterioso mundo e tempo de René Descartes.

 

Lisboa, 20 de Abril de 2015

 
                                                                                   C. Schwengeler

 

 

 

segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Fotos do lançamento







  Caros amigos/as 
Agradeço a todos os que estiveram comigo nestes momentos tão gratificantes, após todo um trabalho de quatro anos e de tanta indecisão sobre a publicação deste livro, cuja finalização me deixou um grande vazio! Para já, encontra-se à venda em Lisboa, nas livrarias Europa-América, Apolo (s) 70 e Ler.








segunda-feira, 30 de novembro de 2015

As semina


Já Paracelso defendia que, antes de aparecerem no espírito humano, as ciências residem nas coisas em que já existe ciência, ou seja, a ciência confunde-se com o objecto conhecido e não com o observador. Aprender é, pois, relembrar tudo aquilo que se sabe, por já existir em cada indivíduo ou, porque se adquire a ciência inata”, que reside no objecto. Eis uma das suas frases que revelam essa luminosa ideia:



“Do mesmo modo que o Sol brilha sobre nós do alto dos céus, assim os talentos necessários ao exercício de uma arte cujos germes existem no coração humano devem ser desenvolvidos sob os raios do sol da Divina Sabedoria. Não é nos livros que encontraremos a sabedoria, nem tão pouco nas coisas exteriores. Não poderemos encontrá-la senão em nós próprios”.

 Paracelso explica que, se a árvore cresce harmoniosamente e se as folhas se desenvolvem segundo uma simetria perfeita é porque existe uma ciência no princípio desse crescimento, a ciência da árvore. No mais pequeno fragmento de erva existe uma ciência perfeita e inata que não poderá ser nunca atingida através do raciocínio. Elas determinam as leis de todas as coisas: a cor, sabor, qualidade, quantidade, posição, figura, relação, duração, etc, a própria essência da natureza. Conhecer os efeitos não é conhecer a causa, a observação dos efeitos não diz nada sobre o conhecimento da causa, por isso, é necessário conhecer a ciência escondida. É preciso, diz, retirar as “escórias” pois “as ciências estão escondidas nas coisas e nada está escondido que não venha a ser manifestado”.